Emoção na formatura da 2ª turma do projeto Cozinha Ceasa-USF

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Uma formatura que tem o peso maior do que só o encerramento de um curso. É o significado de transformação de vida para 28 mulheres que receberam um diploma na manhã desta terça-feira do curso de culinária da Escola de Cozinha da Ceasa. Elas participaram, por seis meses, em aulas semanais, da segunda edição do projeto “Cozinha Ceasa & USF” e se formaram como auxiliar de cozinha.

A segunda turma do projeto foi voltada especialmente para mulheres vítimas de violência doméstica que são acompanhadas pelo Ceamo (Centro de Referência e Apoio à Mulher) da Prefeitura de Campinas e também para mulheres imigrantes (haitianas) atendidas pelo Serviço de Referência ao Imigrante, Refugiado e Apátrida, ambos da Secretaria Municipal de Assistência Social, Pessoa com Deficiência e Direitos Humanos.

“Depois de tudo que passamos na vida, somos mais do que vencedoras. Foi uma experiência nova, rica, tinha dia que parecia que a aula era uma festa. Foi um grande aprendizado, em pequeno tempo, mas significativo para mudar nossas vidas”, declarou Stefani Souza, uma das alunas do curso. “Esse curso não só nos ensinou Gastronomia, mas também nos trouxe de volta a autoestima e a esperança na vida”, disse, emocionada, Cibele Saif, outra formanda.

A cerimônia de formatura contou com a participação de autoridades municipais, como o vice-prefeito, Henrique Magalhães Teixeira, a secretária de Assistência Social, Pessoa com Deficiência e Direitos Humanos, Eliane Jocelaine Pereira, o presidente da Ceasa Campinas, Wander Villalba, e o reitor da Universidade São Francisco (USF), Frei Thiago Alexandre Hayakawa.

O vice-prefeito parabenizou as alunas pela conquista. “Vocês, formandas, provaram que a vida pode ser transformada. E agora vocês podem começar um novo ciclo mostrando que é possível mudar”, destacou Henrique Magalhães Teixeira. O presidente da Ceasa reforçou a ideia. “Daqui para frente vocês tem uma profissão e começa uma nova etapa na vida”, disse Wander Villalba.

O poder de superação também foi enfatizado pela secretária Eliane Jocelaine. “Essas mulheres passaram por muitas dificuldades na vida, mas preferiram enfrentá-las e estão aqui hoje mostrando o quanto isso é possível. Esse resultado tem um impacto positivo para as mulheres, suas famílias e a comunidade em geral”, completou Eliane.

 

 

A história de uma nova mulher

Uma das alunas do curso de culinária que é atendida pelo Ceamo, por mais de 30 anos conviveu com o fenômeno da violência doméstica e conta sua história. Ela prefere não se identificar, mas conta sua caminhada de superação.

“Tenho 64 anos. Fui casada por 40 anos e 30 foram de violência. Muitas vezes com marcas no corpo e também na alma e no coração. Mas eu achava que tudo isso era normal, porque todos os dias acontecia alguma coisa e, no dia seguinte, estava tudo bem e não me faltava nada dentro de casa”, relata.

Assim, foram passando os anos. A violência foi se tornando cada vez mais frequente. Ela já não podia mais sair de casa. As portas ficavam trancadas, ela tinha que ir dormir às 19 horas, sempre debaixo de xingamentos. Os filhos, já casados, deixaram de frequentar a casa dos pais onde sempre conviveram com situações de extrema violência e chegaram a enfrentar o pai por várias vezes. Mas foi ficando, ficando e achando que tudo iria melhorar. O que nunca aconteceu.

Até que há três anos, aos 61 anos de idade, deu um basta. “Eu disse, chega! Falei para a minha filha, estou indo embora, não sei pra onde, mas vou. Ela foi me buscar. Foi aquele auê dentro de casa. Saí com pouca coisa, mas eu saí. E achava que ele iria me perseguir, porque toda noite ele falava que ia me matar”, lembra com pesar. Ficou uns tempos na casa da filha, mas sob a orientação do filho procurou a Defensoria Pública em busca dos seus direitos.

Assim, aos trancos e barrancos, recolhendo os pedaços de vida dilacerados por mais de 30 anos da violência sofrida dentro de casa, a nova mulher buscou ajuda. Atendida por uma assistente social, foi encaminhada ao Ceamo. “Fui acolhida e aprendi muita coisa”, conta. “Descobri que a gente não deve aceitar violência de jeito nenhum e que a gente tem muito direito nessa vida. Mesmo com uma pessoa violenta dentro de casa, você não perde direito de nada. Eu aprendi, me levantei com as palavras das profissionais do Ceamo e também com o testemunho de muitas outras mulheres que vêm aqui (no Ceamo) buscando ajuda. Aqui é onde a gente acha o apoio, onde a gente vê que tem que ser feliz. E hoje, graças a Deus, e graças ao Ceamo, eu sou uma nova mulher. Eu saio, vou passear, não tenho hora de voltar pra casa. Eu nem sabia que sou inteligente, que sei me virar, eu não precisava depender dele. Então, hoje posso dizer que sou feliz graças ao Ceamo!”

 

 

Ceamo

A possibilidade de inserção no mercado de trabalho é de grande valia para o Centro de Referência e Apoio à Mulher (Ceamo) que prepara a mulher para se fortalecer, para ter autonomia, para se sentir capaz de produzir e manter a família. “Muitas vezes, o que as mantém numa relação violenta é justamente a dependência econômica. Quando a mulher se vê autossuficiente, conquista sua autoestima, se sente capaz, não só de manter financeiramente a família, mas de se inserir no mercado de trabalho, de ver que é capaz de produzir coisas belíssimas, pratos requintados como os que são preparados no curso, elas se sentem muito valorizadas,” explica a coordenadora do Ceamo, Elza Fratini.

A coordenadora reforça a questão com o cuidado dos professores em relação à higiene, à postura, como se comportar no local de trabalho, a apresentação do uniforme. “Neste curso de culinária elas se preparam tanto pra aula como para se apresentar pro mercado de trabalho. Assim assumem uma postura diferente. Ficam mais fortalecidas, empoderadas, tomam um lugar diferente, saem daquela postura de se (re)vitimizar e assumem um papel de domínio da situação, de tomar conta das suas próprias vidas”, exemplificou Elza.

O Centro de Referência e Apoio existe desde 2002 e é aberto a toda mulher vítima de violência doméstica. É possível procurar diretamente o atendimento no horário de funcionamento ou ligar para agendar. O contato pode ser feito pelo telefone 0800 777 1050.

O Ceamo fica na avenida Francisco Glicério, nº 1.269, 6º andar, no Centro da cidade. Funciona de segunda a sexta-feira, das 8 às 17 horas.

 

 

Cozinha Ceasa & USF

O projeto “Cozinha Ceasa & USF” é uma parceria entre a central de abastecimento e a universidade que visa a formação profissional de cozinheiras e a alimentação saudável. O curso, idealizado pela Ceasa Campinas, para atender pessoas em situação de vulnerabilidade social com uso integral dos alimentos. Também é voltado às famílias atendidas pelo Instituto de Solidariedade para Programas de Alimentação (ISA), ONG localizada dentro do entreposto campineiro que arrecada o excedente de hortifrútis nos mercados da Ceasa e distribui os alimentos a famílias carentes e entidades de Campinas.

As aulas são ministradas por chefs docentes do curso de Gastronomia e de Nutrição da USF. Entre os temas abordados ao longo do curso estão cozinha básica, cozinha brasileira, cozinha italiana e oriental, panificação e confeitaria. As alunas também aprenderam técnicas de cutelaria (manuseio e afiação correta de facas), higiene e manipulação de alimentos e cortes de legumes e carnes. 

A capacitação de seis meses tem como base o curso da Universidade. E, de acordo com os organizadores, é praticamente o mesmo conteúdo teórico, só é adequado à carga horária do projeto. Ao final do curso, as alunas recebem um certificado reconhecido pela Universidade São Francisco (USF) e pelo Ministério da Educação. O certificado qualifica a pessoa para a atuar no mercado de trabalho como auxiliar de cozinha.

 

 

ISA

O ISA, Instituto de Solidariedade para Programas de Alimentação, é uma Organização Não Governamental (ONG) que funciona dentro da Ceasa Campinas. A instituição surgiu para combater a fome e o desperdício, garantindo o aproveitamento do excedente de hortifrútis e incentivando doações dos comerciantes. 

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